15 fevereiro 2011

Pontes


Karen Armstrong em seu novo livro, “Em defesa de Deus”, passeia pela história mundial sobre a existência de Deus na cabeça dos variados povos do mundo antigo e atual. Ela diz com muita propriedade que o problema do ateísmo no mundo não é Deus propriamente dito, mas os fundamentalistas de várias religiões. Esse grupo é intolerante e não busca a discussão para o crescimento, mas para o convencimento.
Sócrates em sua escola disse que o saber filosófico não é a busca pela solução do problema, mas o caminho que se faz até ele. Disse que saber filosofia não é o conhecimento de tudo, mas o entendimento de si mesmo. Nas reuniões de assembléia do seu tempo, ficava ele destoado do grupo porque as discussões eram uma guerra de idéias pessoais que só acabavam em brigas.
Hoje isso não é diferente! Todas as vezes que uma família, grupos e amigos se reúnem vemos que as discussões em vez de enriquecerem a si mesmo e nos levar ao crescimento e avaliação pessoal elas são um meio que tenho de convencer o outro que a minha idéia é a melhor. Sócrates acreditava que deveríamos ouvir e falar buscando o crescimento pessoal e não a remoção das convicções alheias.
Como terapeuta tenho tentado ver as coisas sempre por dois lados, pois sempre há dois lados, ou talvez até três.
Quando alguém rouba, ficamos com a convicção de termos sido assaltados, mas o assaltante só quis algo pra si que lhe faltava.
Quando uma mulher ou homem é traído pelo cônjuge, ficamos com o adultério, mas o outro só foi em busca de uma felicidade não tida na relação oficial.
Quando alguém comete assassinato por legítima defesa, não deixa de ser assassino, mas só estava apenas se defendendo e não matando.
Quando uma pessoa cria seu ídolo é biblicamente um idólatra, mas isso só foi possível porque o Deus verdadeiro não foi revelado como devia.
Simplesmente não é fácil definir a vida humana! Em todas as ações muitas coisas estão envolvidas e muitas delas desconhecemos.
Quando uma pessoa afirma “fundalisticamente” uma coisa eu acredito estar diante de alguém com ego tão fraco que se ela se abrir pras outras possibilidades existentes perde o caminho. Por isso que o fundamentalismo é o que mais cresce no mundo. Não se pode pensar fora dos padrões!
Recentemente falei sobre crise! Alguém disse que nunca teve! Eu pensei: “Ou essa pessoa aceita tudo, ou não entendeu nada!”
A filosofia propõe o mesmo que a psicanálise, onde se busca a ponte entre a razão e emoção. Quero sentir, mas pensar porque sinto, e quero pensar, porque sentir é importante?
Sem crise eu jamais saberei andar por essa ponte!

07 fevereiro 2011

Cercado


Assim me encontro literalmente!
Diariamente vejo nos noticiários os acidentes climáticos, as tragédias ocasionadas por descuido e crimes de ordem passional, intencional e outras piores ainda.
A mais famosa até agora é a da região Serrana do Rio de Janeiro. Minha cidade, Miguel Pereira, não teve nada, mas as próximas foram quase destruídas como Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo, Itaipava e outras. São inúmeras desgraças. Gente morta, casa perdida e a vida numa “sinuca de bico”. Não há como trabalhar, comprar vender ou até mesmo cuidado eficiente. Doações de muitos lugares chegam por todos os lados. Já se tem notícia de que a Cruz Vermelha e outros órgãos públicos não conseguem receber mais nada de tanta tonelada que chega por dia.
[ Fico impressionado como a solidariedade pra desgraça é virtuosa, mas somos desgraçados para prevenção.]
Enquanto uma turma assistia o jogo de Corinthians e Palmeiras em casa, eu conversava com um rapaz ao meu lado que me dizia ter perdido o irmão há três anos em queda de uma laje, e há um ano e meio a mãe com câncer. Hoje vive só, ainda novo e em formação.
Fiquei pasmo! Próximo a mim, sentado em minha casa vi o rosto da “desgraça” e da solidão, da perda, frustração e sei lá mais o que. Enquanto lutamos pra socorrer os desgraçados de outras cidades o meu vizinho padece!

“Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” Mt.22.39

A grande pergunta é: Quem é o meu próximo? Literalmente meu vizinho, meu amigo, um parente ou quem bate na minha porta? Difícil responder com uma afirmativa, mas se eu pensar que é um amor como a mim mesmo, posso entender que seja apartir de uma identificação. Consigo amar quando consigo entender a dor do outro, porque ela linka com a minha. Quando alguém fala comigo que perdeu a mãe, eu sei o que diz. Perder casa, filho, bens e etc, não faço a menor idéia, logo, dificulto o meu amor porque não sinto nada. Estou fazendo relação do amor com o sentimento, sei disso, mas sem afeto o amor pode soar como falsidade ou busca por mérito. Capite?
Meu próximo é aquele que sintoniza com minha psique! É aquele que me desperta sentimentos projetados, conectados com a minha realidade.
Próximo é todo aquele que me toca por me fazer reviver o que sinto e o que gostaria de sentir.
Veja o que Paulo diz:
“...tenhais o mesmo amor, sejais unidos de alma, tendo o mesmo sentimento.” Fp.2.2
O que passa disso é solidariedade, compaixão e não amor como a si mesmo!
Agora veja: Vivo cercado por todos os lados! Consultório, igreja, amigos, família e por mim mesmo. 

02 fevereiro 2011

Sim ou Não para o EGO ?


Algumas coisas são tão complicadas que presta um dês-serviço a vida de uma pessoa.
No cristianismo comumente ouvimos que devemos negar a si mesmo para seguir a Cristo. Indiscutível isso, até porque acredito no que a Bíblia diz, mas a linha é tênue no que se refere ao ego. Como órgão psíquico em nós, o ego deseja e sofre influencias. Ele segundo Jung entra em contato com o Self para mediar uma situação da persona. No campo Freudiano o ego realiza os desejos do ID ou do Superego. Órgão psíquico mediador.
Ao negar-se os desejos do ego reprimimos sentimentos e ações. Vontades e afetos. Aprendemos como crentes, jogar tudo isso pra Deus. Aprendemos que todos esses sentimentos oriundos do ego são satânicos ou carnais, depende muito da teologia adotada por uma igreja é claro Os pentecostais acreditam que o diabo age em nós através das expressões dos sentimentos do ego. Quando uma pessoa adultera, se prostitui, usa drogas ou faz qualquer outra coisa que venha a ser denominado de pecado, atribui-se essas ações a possessão demoníaca. Então, expulsa o demônio e tudo está resolvido. O que diremos então, quando um pentecostal pula, grita, chora, e expressa sentimentos descontrolados no culto? Ai dizem que é a manifestação do Espírito Santo, ao meu ver, uma outra possessão, só que santa. Nada disso! Tudo isso são manifestações do ego reprimido. Já numa igreja de linha reformada a coisa tende a ser mais racional. Abandonar os desejos do ego é uma atitude de santidade consciente submetida a Deus pelo estudo da palavra. Me parece mais simples o processo nestas igrejas, mas segundo a teologia reformada, todos nós somos escolhidos por Deus e eleitos. Até aqui tudo bem, mas a compreensão da depravação total ferra tudo, porque ninguém presta. Não há bem algum dentro de mim. Então, se o meu ego realiza tudo que não presta segundo eles é porque não sou eleito, ou se realizo atos de santidade é porque estou no caminho. Simples né?
A não valorização do ego no meio cristão evangélico tem produzido um número enorme de crentes depressivos.
Eu prefiro um crente com ego satisfeito, onde tenho de segurá-lo um pouco, do que um deprimido que tenho de animá-lo o tempo todo.
Calvino, idealizador da teologia reformada que vigora com toda força no Brasil, Europa e outros, foi um sujeito de ego forte, que quem discordava de suas convicções era penalizado, uns até com a morte como foi o caso de Serveto.
“Se ele [Servet] vier [à Genebra], eu nunca o deixarei escapar vivo se a minha autoridade tiver peso.” Disse Calvino a seu amigo Farel!
Só porque este homem cria diferentemente de Calvino, seu ego não suportou tal contrariedade e o queimou.
Veja o que Calvino diz:
“Eu espero que o veredicto seja pena de morte.”
O que aconteceu em 1553 com a aprovação de Calvino!
Hoje, os puritanos modernos, detentores da sagrada teologia calvinista, intolerantes com os que pensam diferente deles, queimam não mais na estaca, mas na letra e pela letra.
Ego ferido é um perigo! Como igreja precisamos estudar mais sobre o ego, precisamos entender melhor este órgão psíquico que muitas vezes nos rege.
Será que Jesus, quando disse: "A minha vida ninguém tira, mas eu a dou”. Não foi um ato do ego?
Deus ser trocado por outro deus e punir seus filhos não é um ato do ego divino?
Quando fazemos alguma coisa boa, porque não recebermos elogio? Porque o ego não pode ficar inflado?
Em meu ofício no consultório escuto mulheres e homens dizerem que tiveram outro caso, chamado de adultério no Brasil e no mundo, porque seus cônjuges não os valorizaram como gostariam.
Na visão de quem é trocado surge o adultério, mas na visão de quem troca, é a realização do prazer, o desejo do ego que vigora. Que joga pra cima, que tira da merda, da depreciação e da rejeição. Um é traído e o outro é atendido.
Uma mulher quando me contou que seu esposo a traiu, pensou: "Onde foi que eu errei?" Eu nunca vi uma mulher dizer isso até então, porque o comum é: "Sem vergonha, eu em casa e ele na cama com outra”. Falta esta reflexão nas pessoas! Tudo tem os dois lados, mas pra quem tem o ego severo, rígido e agressivo, nunca a o outro lado, mas sempre o seu lado.
Quando Jesus ouviu no batismo: "Este é o meu filho amado em quem me comprazo”. Suportou o deserto a seguir porque seu ego sabia que alguém lhe amava. 

(silêncio)


Bem, acho que já escrevi o suficiente pra você pensar um pouquinho na relação com as pessoas a sua volta. Nada que se faça é gratuito!